Felipe Bogéa é co-founder e Head de Estratégia na F2F, uma agência de comunicação com origem no digital.
Um pouco sobre o Felipe
Sou um construtor. Tenho prazer no processo de construção e sinto uma enorme satisfação ao ver a “obra” pronta. Isso me leva a gostar de marcenaria, a fazer reflorestamento, a brincar de lego com meu filhos e também a construir empresas. Estou na minha terceira tentativa empreendedora. Dessa vez consegui um relativo sucesso: uma das maiores agências independentes do país, com mais de 150 pessoas no nosso time, grandes contas! Nas duas anteriores, não. Mas isso já é outra história.
Sou um apaixonado pelo mar e por esportes. Desde criança me jogava em todos os esportes que podia e passava horas na piscina ou no mar. Por volta dos 35 anos, (re)descobri o prazer de nadar. E sobretudo me encantei com a experiência de nadar em águas abertas (mar, rios, lagoas…). No começo não conseguia nadar 200m sem parar na borda da piscina. Sabia nadar, mas nunca tinha treinado. Ainda, o sedentarismo e o excesso de trabalho também cobravam seu preço.
Fui gradativamente aumentando meu treino e fazendo provas curtas de natação (3km) no litoral norte de São Paulo. Me sentia muito à vontade no mar, gostava da experiência, mas não tinha tesão na competição em si. Meu desejo não era chegar em primeiro ou mais rápido, mas sim completar o desafio de nadar de um ponto até o outro. Queria me desafiar. Nesse sentido, provas curtas já não eram mais um desafio, pois conseguia completá-las com certa facilidade. Além disso, sempre tive um fascínio por grandes aventuras como subir o Everest ou atravessar o Canal da Mancha a nado. Essa combinação fez com que eu me envolvesse de corpo e alma com ultramaratonas aquáticas.
Depois de três anos treinando, comecei a fazer ultras. Em 2019, nadei 6 horas para completar a Travessia 14 Bis (24km, braço de mar/canal, SP), em 2020, foram 10 horas para completar a travessia da Ilha do Arvoredo (25km, mar, SC), em 2021 nadei quase 15 horas em volta da Ilha Grande (36km, mar, RJ) e em 2022 foram 6 horas nadando no Rio Negro (30 km, rio, AM). Para dar uma noção do esforço (além do número de horas em si), cada quilômetro de natação equivale, em média, a 4 quilômetros correndo, portanto na menor das ultras “corri” uns 100km e na maior uns 150km.
Somando as 4 travessias, equivaleria correr de São Paulo ao Rio de Janeiro! Sou um nadador mediano para ruim (bem lento), mas ao mesmo tempo um dos atletas amadores que mais completou diferentes provas de ultramaratonas no Brasil.
Apesar da aparente ausência de relação entre construir empresas e nadar grandes distâncias, percebo uma correlação enorme entre essas atividades tão importantes na minha vida. Os aprendizados que tenho nas duas atividades me tornam uma pessoa, profissional e atleta melhores. É um ciclo positivo de aprimoramento. É sobre isso que gostaria de compartilhar aqui.
Consistência na execução
Uma das chaves para o sucesso é a consistência e o esforço diário. Isso é verdade em qualquer esfera da vida, mas é nítido nos esportes de resistência (endurance). Ninguém acorda em um belo dia e diz: “hoje vou atravessar o Canal da Mancha nadando”. Não adianta ir para a academia e se matar de treinar um único dia ou algumas poucas semanas. Trabalhar 15 horas em um dia ou 80 horas por semana. Achar que em dois anos vamos fazer a maior empresa de tech da América do Sul. É fundamental a execução consistente e saudável diariamente na busca de um propósito maior. Minha maior prova até hoje, foram os 37 km ao redor da Ilha Grande no Rio de Janeiro. Nadei metade da noite e a manhã inteira direto (exceto por algumas paradas de até 1 minuto, ainda na água, para hidratar). Comecei às 22:40 e terminei às 13:32. Para chegar nessa realização eu treinei alguns anos, aumentando gradativamente meu treinos e as distâncias nadadas. Para construir uma empresa ou uma carreira de sucesso é igual. Na imensa maioria dos casos, daqueles poucos que conseguem sucesso como empreendedores, foram anos ou décadas com execução diária naquele projeto.
Grande objetivo. Pequenas metas
Nesse sentido, outra lição fundamental é ter objetivos ambiciosos combinados com metas exequíveis de curto prazo. Eu me propus a nadar sete das maiores ultramaratonas aquáticas do Brasil em sete anos. Portanto, a cada ano tem um grande propósito. Bacana e motivacional, mas isso implica que a cada semana tenho que nadar muitos quilômetros e pelo menos dez horas de treino semanal. Pode parecer pouco em uma semana, mas fazer isso consistentemente cinquenta semanas no ano é muito difícil. A meta de curto prazo me ajuda a executar diariamente. E aos poucos vou conquistando o sonho maior sem me dar conta. O objetivo de longo prazo da empresa, tem que se tornar anual, mensal e semanal. Cada um no time tem que ter metas claras para perseguir. Tem que ter um indicador e um número na frente para perseguir.
Equipe é fundamental
Falando em time. Ninguém conquista nada de valor sozinho. Correr, nadar ou pilotar podem parecer solitários, mas são coletivos.
“Eu sou parte de uma equipe. Então, quando venço, não sou eu apenas quem vence. De certa forma termino o trabalho de um grupo enorme de pessoas!”
Quem disse isso foi Senna. Escolher pessoas próximas que te apoiem, que já tenham feito aquela trajetória e profissionais competentes faz a diferença. É clichê, mas é verdade. Empreender e construir é sobre pessoas. Atrair, reter e motivar pessoas é função primordial do empreendedor. Questões relativas a pessoas deveriam consumir pelo menos 35% do tempo de um líder. Além de produtivo é prazeroso ver pessoas inteligentes e motivadas construindo a organização que você começou.
Não desista!
Para aqueles malucos que estão começando no empreendedorismo ou em esportes de resistência, tenho que alertar: vai dar vontade de desistir! De chorar! E não é uma vez. Serão inúmeras vezes ao longo do caminho. Durante uma dessas empreitadas, quando estou nadando por horas a fio, algumas vezes tenho vontade de abandonar. O conforto do barco quentinho e um analgésico para a dor do ombro são tentadores. Da mesma maneira, ao longo da jornada de empreendedor, já tive vontade de largar algumas vezes. A segurança de um emprego com o salário garantido no final do mês, não ter que me preocupar se terei dinheiro para pagar todas as pessoas… Nessas horas penso no meu sonho ou objetivo e tento não pensar nos aspectos negativos. A força mental e a resiliência são fundamentais. No esporte de resistência esse aprendizado é muito latente em cada treino longo ou maratona. Persista, tenha resiliência, mantenha o foco e uma hora vai chegar no seu objetivo!
E o seu sonho? Ele só precisa fazer sentido para você
Já para aqueles que estão se perguntando, Felipe: “Qual é o ponto em subir a maior montanha do mundo, ou correr 100 km, ou nadar 30km, ou fazer um Iron Man? Ou mesmo qualquer desafio, não financeiro/profissional, que você se colocou em algum momento da vida? Não tem. A não ser a sua paixão, motivação e vontade de superar seus limites..
Cada ultramaratona que faço é uma batalha comigo mesmo, em um ambiente desfavorável. É o ser humano na sua essência (nado apenas de sunga, touca e óculos) dentro de um oceano ou de um rio. Durante esses desafios, tenho vontade de parar (seja pelo frio, seja pela dor, pelo cansaço ou pela soma deles), mas eu sou protagonista do meu destino. Eu posso escolher entre parar ou perseverar. Aprendo a controlar meu desejo de curto prazo. Aprendo a ter humildade e refletir como sou pequeno e insignificante em relação ao mar, ao mundo. Agradeço as inúmeras oportunidades que a vida me dá. A cada grande travessia, chego do outro lado uma pessoa diferente, melhor. Termino mais forte, mais confiante e, ao mesmo tempo, mais humilde perante o mundo. Deixo a provocação: tente se superar em qualquer esporte e veja como você se sente ao final de um treino ou de uma competição.
De maneira análoga, cada empresa que fundei foi uma jornada e um desafio enorme. Emoções, desejos, sonhos, pessoas, conquistas, derrotas. Empreender é um caminho com alto grau de incerteza, baixa possibilidade de sucesso, mas repleto de conquistas e aprendizados ao longo do trajetória. Claramente, praticar um esporte de resistência tem me ajudado muito, tanto a manter meu corpo mais saudável quanto com lições fundamentais para me tornar uma pessoa melhor. E um líder melhor tem maior chance de sucesso.
Por fim, seu sonho só precisa fazer sentido para você mesmo. A felicidade de cada um é única e os caminhos que lá levam são inúmeros. Ao mesmo tempo, na sua jornada, você vai encontrar pessoas que compartilham das suas loucuras. Se junte com elas. “A vida é uma só até que me provem o contrário”, já dizia o poeta. Não deixe de perseguir seus sonhos da sua vida profissional e pessoal! Um com certeza vai potencializar o outro.
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